segunda-feira, 27 de maio de 2013

As definições empobrecem a vida



As definições empobrecem a vida. Ensinaram-nos o hábito de limitar as melhores coisas dentro de palavras muito pequenas. Amor virou relacionamento, vocação virou remuneração, solidão é desespero para muitos, a pausa é perda de tempo - não é aceitável desacelerar.

Não quero pagar esse preço. Desfaço meus dicionários para inventar novos sentidos. Conformismo não nos faz esquecer as dores, o que nos faz esquecer as dores são as novas razões para sorrir. O tempo não apaga, ele não seria tão cruel.  O tempo ensina a mudar o foco, a olhar as dores com mais doçura, a transformar o erro no aprendizado, a culpa no perdão libertador. O tempo se faz amigo ao acariciar nossa memória. 

Nós somos ricos porque não nascemos prontos. Nossa sorte é que sempre algo nos falta e, consequentemente, há sempre algo a ser descoberto. Perder a capacidade de conviver com nossas urgências é também perder muito de nós. Porque é essa urgência, às vezes disfarçada de medo, às vezes de gentileza, que impulsiona a vida.

Nossa sorte é essa incompletude, nossa sorte é sermos imperfeitos, inacabados. Nossa sorte é que, apesar de pensarmos tanto, sentimo-nos sempre à mercê de nós mesmos e, com isso, entendemos que a autodescoberta é eterna, não é finita em si mesma. Quanto mais vivemos, mais percebemos que é inútil tentar entender tudo. Talvez viver seja apenas encontrar alguém para compartilhar nosso medo de nunca saber e, assim, ajudar a justificar a indefinição do outro. 

Por isso, sempre me encantei com as poesias. Para elas, não importam as propriedades físico-químicas dos elementos, tampouco as definições teológicas, políticas e filosóficas do mundo e das coisas. A poesia é a liberdade das sensações, a leveza de não pensar, a coragem de não precisar compreender. 

Quando criança, meu pai lia Fernando Pessoa para mim e era uma chateação não conseguir entender. Ele dizia: - Não se preocupe em entender, minha filha. O senhor estava certo, pai, não era preciso entender. Percebi que aprendemos a amar o que nos proporciona encantamento e não o que racionaliza nossas dúvidas. A ciência é só o oposto da intimidade. A razão, e não a inocência, é que costuma andar de mãos dadas com a dureza dos dias. 

Não quero as definições que empobrecem a vida...